Fonte: Revista Família Cristã

 

E se isso não for amor?

Quando o amor começa a rimar com dor pode ser uma patologia. Amar não é uma questão de força e de controle emocional, mas livre-arbítrio de ambas as partes no ceder e dar-se

 

Não há dúvidas de que o comportamento amoroso mudou muito e, provavelmente, em decorrência das mudanças ocorridas na sociedade em geral. No entanto, o que ainda não modificou é que no início do sentimento amoroso ocorre uma agradável sensação de bem-estar, pois depositamos na relação um conjunto de desejos e expectativas positivos. Mas, como se pode pressupor, a paixão é transitória, e a relação amorosa realmente começa quando se consegue sair de um aparente estado de transe e encarar a realidade tal como ela é. Entretanto, se as pessoas não têm um conhecimento prévio de si mesmas, algumas vezes, no decorrer do relacionamento amoroso, podem se defrontar com alguns conflitos desnecessários. É o que acontece na PP (Paixão Patológica).

Concebe-se como Paixão Patológica o comportamento excessivo de prestar cuidados e atenção ao parceiro, de modo que o indivíduo abandona atividades e interesses anteriores ao relacionamento. Este quadro se caracteriza pelo excesso de atenção, preocupação e cuidados para com o parceiro, de forma descontrolada, sofrida e repetitiva, no qual o objeto do afeto é colocado como prioridade em sua vida, acima de todos os outros interesses antes existentes e tem o poder de destruir as relações e pessoas.

Síndrome das mulheres – Não são raras as pessoas que, contrariando o bom senso e a crítica razoável, deixam tudo para viver um grande amor, aumentando perigosamente a possibilidade de serem infelizes, ainda que amando. O paciente com este transtorno vive para o objeto de afeto, com condutas excessivas e sufocantes, na esperança de receber de volta um alívio de seus sentimentos pessoais negativos de angústia e de menos valia. Percebem que dão mais do que recebem, e sofrem com isto. Criando um comportamento onde se reconhece claramente, e de forma repetida, prejuízos na vida pessoal, profissional, social, e de seus familiares. Certamente, as pessoas não procuram relacionamentos destrutivos, mas a paixão é capaz de minar temporariamente a capacidade crítica do raciocínio. É importante ressaltar que a PP não é uma questão de quantidade de afeto que se tem por um(a) parceiro(a), mas sim de qualidade do vínculo amoroso que está comprometido em seus fundamentos e propósitos.

Este fenômeno inicialmente foi descrito como “co-dependência” e, a princípio, talhado como “Síndrome das mulheres que amam demais” pela autora Robin Norwood, por ter sido inicialmente identificada em pessoas do sexo feminino que tinham uma incapacidade para estabelecer relacionamentos amorosos saudáveis, com uma tendência constante para se apaixonarem por indivíduos muito problemáticos e ficarem presas emotivamente a estas pessoas. Há de se ressaltar que atualmente também existem homens que “amam demais”, mas, ainda se trata de um assunto tabu na nossa sociedade proeminentemente patriarcal e machista. Embora existam homens que “amam demais” suas parceiras, dificilmente eles procurarão grupos de autoajuda, a exemplo destas, para verbalizar e expor a situação que os incomoda. Eles vivenciam os mesmos sintomas e dificuldades existenciais que as mulheres acometidas pelas consequências negativas da PP, sendo que para eles é talvez mais difícil se tratar, pelo fato de que a nossa sociedade não valida esta patologia nos homens. Apesar de acometer ambos os sexos, a Paixão Patológica parece ser prevalente na população feminina, uma vez que, além das queixas serem mais referidas pelas mulheres, em geral, são elas que consideram a relação a dois como prioritária em suas vidas.

Mudanças emocionais – Ainda que os manuais psicoterápicos e psiquiátricos não reconheçam oficialmente a PP na lista das patologias, devido ao fato que os critérios diagnósticos continuam em estudo, provavelmente você seja ou conheça alguém que manifeste esses sintomas. E se os afetados desconhecem sua condição e a patologia vier a se tornar crônica, esta pode gerar níveis de estresse que diminuem sensivelmente a qualidade de vida e culminam em mal-estar físico generalizado e até em outras doenças (cardiovasculares, dependências químicas), somente para citar algumas.

Muitos negam ou desconhecem estar doentes, e a necessidade de serem tratados. Dessa forma, a permanência em um relacionamento destrutivo pode ser diagnóstico de Paixão Patológica. As pessoas com perfil de baixa autoestima, dependência emocional do parceiro, ansiedade e depressão são as mais vulneráveis a relacionamentos perigosos. Pacientes afetados por essa síndrome dificilmente dão ouvidos a amigos, familiares e qualquer outra pessoa que tente alertá-los sobre o caráter do(a) parceiro(a).

Nos casos de Paixão Patológica, a ajuda psicológica torna-se fundamental, porque é natural que a pessoa sinta um enorme vazio e imensas mudanças emocionais quando tenta se comportar de forma diferente com o (a) companheiro (a) ou quando o relacionamento requer uma separação ou mesmo um afastamento temporário. Há quem se mantenha apaixonadamente dependente a vida toda para não ter de passar pelo angustiante processo de separação. A pessoa acredita que não suporta viver sem essa pessoa e prefere se manter infeliz e insatisfeita enquanto perdurar a relação. A psicoterapia ajudará ainda que esta pessoa  comece a questionar sobre a razão que a leva a se sentir atraída por alguém com determinadas características negativas e a perceber a origem desse comportamento, de forma a ultrapassá-lo.

Veja se você ama
Para ajudar na avaliação da sua “dosagem” do amor com relação ao(a) seu(sua) parceiro(a), procure se questionar sobre:
Você costuma se sentir satisfeito(a) com a quantidade de atenção e tempo que despende ao seu parceiro ou percebe que fez mais do que gostaria?

Você acha que a quantidade de atenção que dirige ao (à) seu (sua) parceiro (a) está sob seu controle ou é comum tentar diminuir e não conseguir?

Você mantém outros interesses e relacionamentos ou abandonou pessoas e funções em decorrência da sua vida amorosa? Você continua se desenvolvendo pessoal e profissionalmente após o início de seu relacionamento amoroso?
Se respondeu “não” à maioria das questões, é um sinal de alerta para a Paixão Patológica. Nesse caso, existe a necessidade de realizar uma avaliação clínica mais aprofundada com um especialista.